Elder no RCA: uma viagem sonora de inovação e introspeção

Os Elder não são apenas uma banda; são uma força criativa que constantemente reinventa a sua música, desafiando as fronteiras do rock e criando paisagens sonoras inexploradas. Em Lisboa, a banda levou o público a uma viagem que, mais do que um concerto, foi uma experiência transformadora e imersiva, repleta de sonoridades psicadélicas, progressivas e épicas.

Texto: Sandra Pinto
Fotos: Luís Pissarro

Vindos de Braga, os TRAVO são um dos nomes mais incendiários da nova vaga do rock psicadélico português. O quarteto tem conquistado palcos dentro e fora do país com uma fusão explosiva de psicadelismo de alta voltagem e atitude garage rock sem remorsos, construindo uma identidade sonora que desafia géneros e expectativas. Depois de incendiarem a cena underground com Sinking Creation (2022), um álbum conceptual inspirado em The Blue World de Jack Vance — onde uma tripulação se amotina num mundo oceânico povoado por criaturas mitológicas e deuses tirânicos — os TRAVO mergulharam numa viagem sonora intensa e distópica. Com o mais recente álbum, Astromorph God, consolidam o seu som atual e expandiram ainda mais o seu universo musical. O disco é uma odisseia de distorção e energia desenfreada, onde o misticismo cósmico se cruza com a brutalidade do rock. Esta fase marca também a projeção internacional da banda, que já passou por festivais como FOCUS Wales, Trans Musicales, Eurosonic, Sonic Whip, Krach am Bach, Freak Valley Festival e Misty Fields, e gravou uma explosiva live session na KEXP, em Seattle, um feito que atesta a força e autenticidade do seu som. Ao vido a banda transcendeu o formato tradicional de espetáculo. As suas atuações são erupções de energia psicadélica, onde o público é arrastado para uma experiência quase ritual. Gritos, riffs abrasivos e solos vertiginosos fundem-se num delírio coletivo, dissolvendo a fronteira entre realidade e êxtase auditivo. Foi ali, em cima do palco que os TRAVO provaram porque considerados uma das mais intensas e viscerais do panorama europeu contemporâneo. Quimera sonora, uma alquimia entre o psych, o garage, o prog-rock e o thrash-metal, evocando o espírito de bandas como King Gizzard & The Lizard Wizard, mas com uma escuridão e intensidade muito próprias, cada riff é um manifesto, cada concerto uma tempestade elétrica: um convite a perder-se entre o caos e o cosmos.

Composta por Nicholas DiSalvo (guitarra e vocais), Jack Donovan (baixo), Michael Risberg (guitarra) e Georg Edert (bateria), os Elder têm sido uma referência no rock underground desde a sua formação, em meados dos anos 2000, numa pequena cidade costeira de Massachusetts, nos EUA. Inicialmente uma força dominante na cena stoner/doom, evoluiram com o passar dos anos para uma das vozes mais únicas do rock moderno, sempre explorando novas direções e desafiando os limites do género. A atuação em Lisboa foi o reflexo dessa evolução constante. A banda não se limitou a executar as suas músicas, mas sim a levar o público numa verdadeira viagem sonora, onde cada composição se desdobrava como uma história, capaz de transitar entre estilos que vão dos anos 70 até o presente, com momentos de pura “grandeza da era gatefold”, como descreveu a Rolling Stone. As longas passagens instrumentais, com riffs pesados e uma intensidade emocional imensa, fundiram-se com momentos de introspeção, mais delicados e atmosféricos, criando uma dinâmica única. O mais recente álbum dos Elder, “Innate Passage” (2023), foi uma das grandes estrelas da noite. Gravado em Hamburgo, na Alemanha, o álbum apresenta uma expansão ainda maior do vocabulário musical da banda, explorando uma paleta sonora mais rica e aventureira. As faixas fluem como uma jornada contínua, onde os riffs colossais e as batidas densas dão lugar a jams psicadélicas e grooves imprevisíveis, mantendo a autenticidade e a complexidade que são marcas registadas dos Elder. Foi uma verdadeira celebração do som em constante evolução da banda. A nova formação, que inclui o guitarrista Michael Risberg e o baterista Georg Edert, trouxe uma nova dinâmica ao grupo, e o concerto em Lisboa foi a perfeita demonstração disso. A química entre os membros da banda é visível, com cada um deles a entregar-se completamente à sua arte, criando momentos de pura magia musical. O baixo de Jack Donovan, com a sua profundidade e peso, e a bateria de Edert, com a sua precisão e fluidez, complementam perfeitamente a guitarra de DiSalvo, cujos riffs não deixam de surpreender a cada nova passagem. Desde o lançamento do seu primeiro álbum, em 2008, até os álbuns posteriores, como “Lore” (2015) e “Reflections of a Floating World” (2017), os Elder não pararam de desafiar os limites do rock. O álbum “Lore”, em particular, marcou um momento de viragem na carreira da banda, fundindo elementos do post-rock, rock progressivo e space rock, o que lhes granjeou o título de “Álbum da Década” pelo The Obelisk. Já “Reflections of a Floating World” (2017) foi amplamente aclamado, entrando para as listas de melhores do ano de publicações como Rolling Stone e Stereogum. Em 2019, a banda surpreendeu com o lançamento do EP experimental “The Gold & Silver Sessions”, que mostrou uma faceta mais suave e introspectiva do grupo. Em vez dos habituais riffs esmagadores, os Elder exploraram batidas motorik, teclados exuberantes e composições mais esparsas. A evolução da banda continuou com “Omens” (2020), onde a mistura de melodias intricadas e jams espaciais levou a música da banda a um nível ainda mais complexo e expansivo. Com a pandemia a interromper os planos iniciais, os Elder não pararam de criar. “Innate Passage” foi o resultado desse período de introspeção e criatividade, demonstrando a capacidade da banda de se adaptar e continuar a crescer. Em 2024, a banda recebeu uma grande oportunidade ao ser convidada para abrir os concertos dos Tool na sua digressão pelos Estados Unidos, uma experiência que culminou no lançamento do álbum ao vivo “Live at BBC Maida Vale Studios”, gravado durante a digressão de 2023.  O concerto em Lisboa foi uma celebração de tudo isso: da constante reinvenção musical, da energia vibrante da nova formação, e da capacidade única de Elder de criar atmosferas imersivas e complexas. A banda não tocou apenas as suas músicas; eles pintaram paisagens sonoras que levaram o público a viajar por sonoridades e emoções diversas, desde o peso do doom até a leveza do rock progressivo, sempre com uma qualidade de execução impecável. Com o próximo álbum agendado para 2025, os Elder continuam a sua jornada de experimentação e evolução, mostrando que estão longe de estagnar. O concerto em Lisboa foi mais uma prova do seu lugar no topo do rock underground, e quem esteve presente não esquecerá a magia e a intensidade da sua música tão cedo.

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