E a menina dançou na Aula Magna ao som dos Dead Combo

Eram 22h20m quando as luzes da Aula Magna se apagaram, cedendo a vez aos Dead Combo. Nascidos em 2002, o duo composto por Tó Trips e Pedro Gonçalves tem vindo a conquistar o seu espaço no universo musical nacional. Mas, sem dúvida, merecem muito mais do que isso, pois revelam-se, tanto em disco confirmando-se ao vivo, como inovadores e excelentes executantes. Quem sabe se o primeiro passo para a sua internacionalização não terá sido dado com a inclusão de músicas dos Dead Combo como banda sonora da passagem de Anthony Bourdain e do seu “No reservations” por Lisboa?

Começaram com “Rumbero”, do álbum Vol.I, de 2004, (o seu primeiro registo discográfico), para logo de seguida atacarem com “Sopa de Cavalo Cansado”, do Lusitânia Playboys, de 2008, e “Cachupa Man”, do último Lisboa Mulata, lançado em Outubro do ano passado.

Desde o primeiro momento os Dead Combo têm primado pela busca de sons inovadores, numa ímpar mistura de influências musicais. Com Lisboa Mulata (o qual já tínhamos tido ocasião de ouvir ao vivo no âmbito do Vodafone Mexefest de 2011) passeiam-se sem receios ou pudores pelos ritmos africanos que encontraram em deambulações musicais por esta Lisboa, cada vez mais ponto de encontro de outras culturas.

Ainda do último trabalho foi a vez de “Anadamastor”, um tema dedicado a Ana, empregada do café Adamastor “ali ao pé do largo de Santa Catarina”, esclareceu Tó Trips, seguido de “A Menina Dança” (dedicado à Mãe de Tó Trips) e “O Assobio”, inspirado no famoso assobio de Vasco Santana, que em miúdo Tó julgava ser da autoria do seu avô, ambas do Quando a Alma não é Pequena, Vol. II, de 2006.

Pelo meio um “foi muito fixe vocês terem vindo aqui hoje! Obrigado nós!” dito com emoção por Tó Trips.

Seguiu-se o desfilar de uma mão cheia de excelentes músicas num cenário de luzes extremamente cuidado, que nos transportava para o mundo dos Dead Combo, com imagens de uma Lisboa memorável em pano de fundo, lembrando que muitas das suas influências vêm precisamente do fado e das guitarras que o acompanham. A “Quando a Alma não é Pequena”, de 2006, e “Putos a Roubar Maças”, do Lusitânia Playboys, seguiram-se três músicas do Lisboa Mulata, “Aurora em Lisboa”, “Morninha do Inferno” e “Cowboy’s Cure For Jah”, esta última “inspirada no dub e no reggae do pessoal do alto de Santa Catarina”, disse To Trips da música que transporta a emoção da distorção das guitarras e a excitação do improviso. Antes da entrada dos primeiros convidados da noite ouviu-se “Pacheco”, do álbum Vol.I, uma homenagem ao guitarrista Pacheco que acompanhava a fadista Hermínia Silva.

Com “Esperanza”, do Quando a Alma não é Pequena, Vol. II, chegaram ao palco as Víboras do Chiado, coro de vozes femininas composto pelas cantoras Cátia Leonardo e Ingrid Fortes. Por lá continuaram para acompanhar Pedro Gonçalves e Tó Trips nas músicas “Like a Drug”, cover de uma música dos Queens of The Stone Age, que de acordo com o guitarrista “é uma versão tipo rádio que está a tocar na cozinha de um restaurante chinês” e “Esse Olhar que Era só Teu”, do Lisboa Mulata, e baseada num tema interpretado por Amália em “estilo africano” num trabalho do realizador Bruno Almeida.

Sem fazer alarido, discretamente, chega o segundo convidado da noite, o fadista Camané, que interpreta “Ouvi o Texto Muito ao Longe”, um poema de Sérgio Godinho para uma música dos Dead Combo e incluído no Lisboa Mulata. De arrepios se fez este concerto único, que teve em “O Vendaval”, música de Tony de Matos (1924-1989), interpretada por Camané com os arranjos fabulosos dos Dead Combo, um momento alto, o qual trouxe até à Aula Magna a magia de tempos antigos e de outra música portuguesa. Mas, a magia continuou pois seguiu-se “Inquietação”, canção de José Mário Branco, aqui com uma roupagem musical à Dead Combo cantada por Camané.

“Cuba 1970” serviu de mote à entrada da Royal Orquestra das Caveiras (composta por Alexandre Frazão, na bateria, Ana Araújo, no piano, João Cabrita, no saxofone, João Marques, no trompete e Jorge Ribeiro, no trombone) que, em 2009, se juntaram aos Dead Combo dando corpo ao DVD Dead Combo & Royal Orquestra das Caveiras gravado ao vivo no Teatro Municipal de São Luiz, em Lisboa. Com mais de uma hora de concerto era hora de desfilarem pelo palco da Aula Magna músicas como “Manobras de Maio” e “Desert Diamonds”, do acima referido DVD, e “Lusitânia Playboys”, música titulo do álbum de 2008, que fala “de dois gajos do jazz que vão ao Cais do Sodré dos velhos tempos e acabam por andar à estalada com dois marinheiros”!

Seguiram-se “Blues da Tanga”, do Lisboa Mulata, “Mr. Eastwood”, do Vol. II, com a qual somos transportados para o oeste norte-americano, onde parece que numa qualquer esquina nos vamos deparar com um duelo, “Operação Outono”, tema homónimo do filme ainda por estrear de Bruno Almeida, “Rodada”, do Vol. II, “Old Rock and Roll Radio”, onde o jazz esteve presente como que a trazer até à Aula Magna o ambiente dos velhos cabarets do século passado, e a última música “Marchinha do Santo António Descambado”, do Lisboa Mulata, num apelo aos movimentos do corpo numa dança cadente e sensual.

Claro que ninguém arredou pé, pelo que o encore esperado não se fez esperar muito, tendo sido iniciado com a primeira de quatro músicas, “Cacto”, apresentada pela banda como a sua primeira música, seguida de “Elétrica Decadente” e de “Malibu Fair”. O concerto terminou com o tema título do último trabalho dos Dead Combo, “Lisboa Mulata”, final apoteótico para quase três horas de um concerto majestoso de uma banda que com o último trabalho demonstra uma enorme versatilidade acrescentando os sons africanos ao western-fado-tango-flamenco que nos tinha habituado em trabalhos anteriores. No final Tó trips voltou a agradecer a presença de todos quantos foram à Aula Magna ver algo que nasceu para tocar em buracos!  Impossível não terminar com uma única palavra: memorável!
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