Brands that matter: Zoo Santo Inácio, em nome da conservação da natureza e da vida selvagem
Teresa Guedes é hoje a diretora do Zoo Santo Inácio, e tem como missão defender e preservar a biodiversidade, conservar as espécies mais vulneráveis e sensibilizar o público em geral para a urgência da mudança de comportamento, da preservação das espécies e da natureza. Estivemos à conversa com a responsável sobre a história desde espaço que nasceu do sonho da família de Teresa, que, apaixonados pela natureza, ambicionavam criar um jardim zoológico diferente.
Como surgiu o seu interesse pela natureza e a sua conservação?
Desde que me recordo que estou ligada à natureza e aos animais. Até aos meus 05 anos, os meus pais tiveram uma Quintinha, como lhe chamávamos, onde me lembro de ajudar os meus pais a cortar a relva, a podar as plantas, a serrar árvores e a ver girinos e cobras. Paralelamente, nasci com a bênção de pertencer a uma quinta rodeada de árvores, de flores e de animais, onde aprendi a desfrutar dos aromas e das sensações do ar livre, na Quinta da Aveleda, em Penafiel. Os meus pais souberam plantar em mim este legado, com uma educação que sempre foi virada para o mundo da natureza, tendo sido determinantes em fomentar a relação de proximidade com a terra, com as plantas e com os animais. No fundo, está no meu ADN.
Tudo isto me levou a decidir que o meu rumo teria de passar por aqui e, desde que o meu pai encetou caminho para aquilo que é hoje o Zoo Santo Inácio, que senti que o meu lugar seria aqui, rodeada de animais e de natureza, com um propósito muito claro: participar na ação de preservar o nosso planeta, da mais pequena flor, à grande girafa. Assim, ingressei no curso de Engenharia Zootécnica e, em 2006, comecei a minha vida no Zoo Santo Inácio, onde todos os dias luto para que as nossas pequenas ações possam fazer a diferença na conservação da natureza.
Hoje encara isso como uma verdadeira missão de vida?
É, sem sombra de dúvidas, uma missão de vida. Apaixona-me estar rodeada pela biodiversidade e absorver toda a vida que existe à nossa volta. E passar estes valores a quem nos visita, poder fazê-los ver, admirar e partilhar esta visão, aproximando-os da natureza e dando a conhecer as particularidades de cada animal, é fundamental para sensibilizar a comunidade em geral para esta que é já uma ameaça à nossa própria sobrevivência.
E o Zoo Santo Inácio, quando e como surgiu essa ideia?
A história do Zoo iniciou-se em 1996 quando o meu pai, Roberto Guedes, começou a trabalhar na empresa vitivinícola da família, a Quinta da Aveleda. Nessa altura, desafiaram-no a dar vida a um dos terrenos familiares em Vila Nova de Gaia, conhecido como a Quinta de Fiães.
Foi assim que a família Guedes decidiu dar um novo rumo à quinta, que ia sendo alugada para casamentos. A paixão pela natureza aliada à consciência de que era fulcral proteger e conservar as espécies mais vulneráveis, permitiram a realização de um sonho já antigo: a criação de um parque que pudesse acolher animais, mostrá-los tal como eles são, privilegiando aqueles que se encontram em risco de extinção.
A ideia foi sempre criar um zoo diferente, procurar o bem-estar dos animais e tentar replicar o habitat natural de cada um deles. Abrimos portas em junho de 2000 e, este ano, assinalamos já 23 anos a cumprir uma grande missão: a conversação da natureza e da vida selvagem, especialmente das espécies ameaçadas de extinção.
Inspirou-se em algum espaço similar que tenha visitado?
O meu pai, desde que recebeu o desafio de transformar este espaço, viajou por Inglaterra, França, Itália e Espanha para se inspirar, e tinha uma ideia que não iria abandonar: manter a relação com a natureza.
A sua intenção era construir um espaço amplo, verde, onde os animais se sentissem bem e o público pudesse esquecer que estava numa grande cidade. Mas, no início, nem sempre foi simples, porque em Portugal, especialmente no Norte, não havia muito conhecimento sobre parques zoológicos. Até que, numa viagem ao Algarve, o meu pai conheceu uma alemã que estava reformada e tinha várias ideias sobre zoos. E, no fundo, foi assim que tudo começou: durante os quatro anos em que duraram as obras o meu pai esteve aqui todos os dias, para explicar aos trabalhadores como queria um parque natural, onde os animais tivessem o seu espaço o mais semelhante possível com o habitat natural. Depois, faltavam os protagonistas e, assim, chegaram as emas
da Austrália, as panteras das neves, uma espécie ameaçada de extinção, entre outros animais.
Atualmente, a inspiração é feita de várias visitas a outros Zoos, a partir de documentários e imagens de revistas. Há tantas e boas ideias já implementadas!
Porque escolheu o nome de Santo Inácio?
Esta quinta recebeu este nome pois a capela da casa de família é dedicada ao Santo Inácio de Loyola.
Exatamente onde se localiza e qual a área total do Zoo?
Estamos localizados em Avintes, que pertence a Vila Nova de Gaia, no Porto, mais concretamente na Rua 5 de Outubro, 4503-809 Avintes. Contamos com mais de 15 hectares de espaço ao ar livre, onde estão incluídos os habitats dos nossos animais e jardins muito bem cuidados.
O que o distingue relativamente a outros espaços semelhantes?
O Zoo Santo Inácio é o maior e mais verde Zoo do Norte e reconhecido como um local de contacto próximo com a natureza e com o mundo animal, que promove experiências únicas em torno da sensibilização para a conservação de espécies. Durante a visita, convidamos os visitantes a apreciarem os animais e as plantas que aqui vivem. Que os conheçam, que aprendam mais, que partilhem essa informação e que, connosco, os preservem.
A proteção da vida selvagem e o bem-estar dos animais são a principal preocupação do Zoo Santo Inácio. Todas as espécies acolhidas pelo Zoo habitam ambientes verdes e amplos, concebidos de forma a recriar os seus habitats naturais, proporcionando-lhes as melhores condições para que possam manter os instintos animais.
Este ano recebemos a primeira exposição de luzes realizada num zoo em Portugal, as Luzes Selvagens, e num percurso de cerca de um quilómetro, os visitantes puderam descobrir a magia da natureza através de 500 figuras iluminadas de animais e plantas.
Perante isso qual é a missão e filosofia do Zoo?
Desde o primeiro dia que o objetivo do Zoo Santo Inácio prevalece o mesmo: aproximar a comunidade dos animais selvagens, num ambiente que procura ser semelhante ao da sua origem, de forma a permitir que os conheçam melhor e, assim, que partilhem connosco a missão de ajudar a preservar a natureza.
Podemos ressalvar três eixos principais de atuação:
• Conservação: cooperamos em mais de 42 Programas Europeus de Reprodução de Espécies Ameaçadas (EEP) e procuramos manter as populações saudáveis,
com diversidade genética, para garantir a pureza das espécies e, assim, que as suas descendências possam um dia regressar aos habitats naturais;
• Educação: aproximamos os visitantes da vida selvagem e promovemos a compreensão do papel de cada animal na natureza, favorecendo uma maior
sensibilização para a sua conservação.
• Investigação: participação em estudos individuais dos animais e/ou das espécies, garantindo um aumento do conhecimento técnico a nível mundial.
De que forma atuam ao nível da conservação de espécies consideradas mais vulneráveis?
Os zoos têm um papel vital na conservação da biodiversidade e que nem todos conhecem. Somos o ensino, a sensibilização e a aproximação da comunidade à natureza e à vida selvagem, só assim, podemos fazer com que compreendam o papel de cada um destes animais na natureza e no mundo em que vivemos para que, no futuro, a queiram preservar.
Podemos, ainda, afirmar que a conservação é o nosso principal propósito. Ao cuidarmos das espécies ameaçadas de extinção, criamos um local propício à reprodução, e é precisamente aqui que entram os EEP’s, através dos quais se pretende aumentar o número de animais com vista a reintroduzi-los na vida selvagem. Sabemos que a cada dia que passa, aumentam as ameaças à sobrevivência da vida selvagem e estes programas passam a ser fulcrais para garantir a não extinção de várias espécies.
A nível da investigação, os Zoos têm um papel fulcral no aumento do conhecimento partilhado por todas as instituições que se dedicam ao mundo animal. Todos os dados que possamos recolher quer através de análises, exames ou observação diária podem ter uma representatividade enorme em algumas espécies que poucos ou nenhuns estudos têm.
No que respeita à educação, os zoológicos são essenciais na divulgação das espécies (especialmente as mais ameaçadas) a todos os que visitam os parques, dando a conhecer as suas características, as causas à sua ameaça de sobrevivência e de que forma ainda podem ser salvas.
Ainda, ao nível financeiro, grande parte dos projetos de conservação in-situ (no local de origem de uma espécie) são possíveis ser postas em prática graças a angariações de fundos e de donativos fornecidos por parques zoológicos de todo o mundo.
Na sua opinião estão a pessoas mais sensíveis a este tema?
Já desde 2004, a pesquisa por temas como biodiversidade, espécies ameaçadas ou aquecimento global aumentou substancialmente. No entanto, diz-nos a nossa experiência que defendemos melhor aquilo que nos é próximo e conhecemos e, por isso, temos um papel tão importante na sensibilização e envolvimento de todos para um só lema: defender e preservar a natureza.
Aliás, podemos dizer que, nos últimos anos, sentimos um aumento à adesão aos programas dos apadrinhamentos de animais, como forma de apoiar a conservação de espécies. Escolher apadrinhar um dos mais de 600 animais do Zoo, é preservar a biodiversidade, mas, também, investir no conhecimento e na sensibilização, uma vez que o padrinho fica habilitado a visitar o seu afilhado quantas vezes quiser durante um ano.
Nos dias que correm, é difícil não estar alertado para este tema, uma vez que são inúmeras as campanhas de conservação que ouvimos e vemos diariamente.
Quer seja pela redução obrigatória do plástico de utilização única; pela recente aprovação do acordo pela proteção de 30% do planeta até 2030; pela poluição alarmante dos oceanos ou até pela diminuição drástica de insetos, como as abelhas, as pessoas, principalmente os mais jovens, estão a par e preocupam-se com a sua sobrevivência.
Com a sua experiência nota uma evolução por parte do público relativamente a esse tema?
Quando iniciei o meu percurso no Zoo em 2006, sentia-se um afastamento muito grande em relação a temas ligados à natureza, zoos, conservação de espécies e sobre a missão de salvar o planeta. Atualmente, sinto que a maioria das pessoas que entra no Zoo Santo Inácio relaciona-se mais facilmente a cada um destes temas, procurando saber como ajudar a nossa missão.
Ainda, reparo que a maioria dos visitantes sai do Zoo com a mensagem que tanto queremos transmitir: todos temos um papel na preservação da natureza. Seja através de uma pequena mudança de comportamento ou com um passo gigante direcionado para este grande objetivo, todos contam e todos terão um efeito positivo em cada ação praticada.
Parece-lhe que existe uma verdadeira consciência da importância da mudança de comportamento?
Posso afirmar com muito orgulho que cada vez mais visitantes que passam pelo Zoo Santo Inácio, conhecem e abraçam a missão de apoiar a preservação do nosso planeta. Sentimos que através do empenho de todos os colaboradores e dos visitantes, que a nossa missão, apesar de infindável, é cumprida!
Sinto que essa consciência tem sido cultivada. Seja por campanhas publicitárias de produtos, seja por desastres naturais aos quais cada vez mais assistimos, ou até por epidemias, as pessoas foram obrigadas a meditar um pouco sobre o que passa ao nosso redor e sobre a importância do seu papel no mundo e para as próximas gerações.
Se fizermos um exercício de memória, era comum ver-se pessoas a atirarem lixo para o chão ou pela janela do carro e as praias estavam carregadas de lixo. Hoje, vêem-se grupos escolares a fazerem campanhas de sensibilização e de recolha de lixo. Diria que alguma coisa mudou!
Quantas espécies de animais ali podem ser vistas?
No nosso parque habitam cerca de 600 animais distribuídos por invertebrados, répteis e anfíbios, aves e mamíferos.
De quantas espécies?
São mais de 200 espécies diferentes, e destas mais de 35 pertencem a Programas de Conservação e Programas Europeus de Preservação de Espécies Ameaçadas de Extinção (EEP’s) onde o Zoo coopera.
São todos oriundos da Europa ou acolhem animais de outros continentes?
No Zoo, temos animais de todos os cantos do mundo. Contudo, importa referir que nenhum animal que vive no Zoo Santo Inácio foi capturado da natureza, comprado ou vendido. Esta é, de facto, uma das perguntas que nos fazem mais vezes “De onde vêm os animais?”. Todos os animais que albergamos provêm de outros Zoos da Europa, a maioria deles pertencentes à EAZA (Associação Europeia de Zoos e Aquários). Ainda, trocamos animais entre os vários zoos, de forma gratuita, e com o objetivo único de manter as espécies, garantindo a diversidade genética.
Imagino que tratar de tantos animais não deva ser fácil ou simples…quantos colaboradores têm?
Ao longo dos anos fomos crescendo, não só em espaço, como em Equipa. Atualmente, já somos mais de 50 colaboradores, passando por várias áreas como o departamento veterinário e dos tratadores, manutenção, limpeza, jardinagem, bilheteira, restauração, educação, loja, contabilidade, administrativo e comunicação.
Quais os vossos maiores desafios?
O maior desafio é, desde o primeiro dia, despertar a sociedade para uma problemática cada vez mais real: não existe planeta B e é fundamental que todos tenhamos um papel na conservação da natureza e das espécies ameaçadas.
Quem acompanha o percurso de Jane Goodall, a cientista que revolucionou o estudo dos primatas, já a ouviu certamente dizer que “é impossível passar um único dia sem ter um impacto no mundo ao nosso redor”. É sabido que as mudanças ambientais naturais, como os terramotos, o aumento da temperatura e consequente degelo têm vindo a aumentar drasticamente. No entanto, é também evidente que o homem tem tido a sua quota-parte nas alterações da natureza, nomeadamente através da utilização de terrenos selvagens para urbanização, para a indústria ou para o cultivo intensivo.
Por consequência, o equilíbrio dos sistemas essenciais para a vida vê-se, assim, interrompido e, embora a natureza tenha uma resiliência notável, não tem tempo suficiente para recuperar e, como tão bem afirma David Attenborough, “é nossa responsabilidade fazer tudo ao nosso alcance para criar um planeta que forneça um lar não apenas para nós, mas para toda a vida na Terra”. Nunca é demais relembrar que não são apenas as espécies individuais que se veem ameaçadas, mas sim todo o planeta. E este é, sem dúvida, o nosso maior repto.
Como foi passar por uma pandemia como a Covid-19?
Foram momentos de muita incerteza, mas os cuidados dos animais não entraram em quarentena. Mesmo no período em que estivemos de portas fechadas ao público, garantimos o bem-estar de todos os nossos animais. E o que mais nos surpreendeu foi que, quando retomámos à normalidade e pudemos abrir o nosso parque aos visitantes, contámos com casa cheia. De facto, sentimos que as pessoas se aperceberam importância que a natureza tem nas suas vidas, que necessitavam estar mais tempo e usufruir do ar livre.
Hoje, 23 anos depois da abertura do Zoo qual o balanço?
Passados mais de 20 anos, já somos a casa de 600 animais, temos uma família de 50 colaboradores e recebemos uma média diária de mais de 500 visitantes. Impactar, sensibilizar ou deixar o tema “preservação” na mente de tanta gente, diariamente, é sem dúvida uma grande responsabilidade.
Estamos conscientes do perigo iminente da extinção de milhares de animais em todo o mundo e, por isso, nunca cruzamos os braços. Somos apaixonados pelo que fazemos e sentimos que todos juntos temos o poder de mudar este rumo e proteger a vida animal.
O balanço é extremamente positivo, especialmente sabendo que os visitantes saem do Zoo Santo Inácio muito satisfeitos e com o desejo de nos revisitar e de cooperar com os nossos programas.
Mas o caminho faz-se caminhando e, no que toca à preservação da natureza e das espécies, ainda é longo e demorado. Temos muitos projetos em carteira, muita vontade, empenho e paixão imparáveis. Por isso, cá estaremos para o percorrer com todos os nossos queridos visitantes.