À conversa com Uni_Form

O ano de 2006 viu nascer um dos mais interessantes projetos musicais nacionais, os Uni_Form. Com dois álbuns e muitos concertos pelo meio, viram agora chegar o convite para fazer a primeira parte do concerto do antigo membro dos Joy Division, Peter Hook, em Lisboa. Excelente ponto de partida para uma conversa.
De acordo com o site oficial do Misty Fest “a recomendação relativamente aos portugueses Uni-Form veio do próprio Peter Hook que convidou o grupo a abrir o seu concerto no CCB”. O que é que sentiram quando o convite chegou?
Sentimos uma alegria muito grande por fazer a primeira parte do concerto de alguém que nos marcou muito a nível musical e por ter a oportunidade de partilhar o palco numa celebração aos Joy Division.
Têm nos Joy Division uma das vossas mais fortes influências?
Sim, podemos dizer que os Joy Division são uma das nossas mais fortes influências. Os Joy Division são uma banda transversal ao tempo, não só marcaram a sonoridade de uma época, como continuam a influenciar muitos músicos ainda nos dias de hoje, principalmente aqueles que, como nós, cresceram nos anos 80 a ouvi-los e a ouvir outras bandas também influenciadas por eles.
Além deles que outros vos inspiram?
Existem várias outras bandas que de certo modo nos inspiram. São, principalmente, bandas que acompanharam o nosso crescimento enquanto pessoas e enquanto músicos também. Podemos falar dos The Cure, dos Pixies, dos Bauhaus, dos Depeche Mode, The Jesus and Mary Chain, entre outros.
Nasceram em 2006, como é que tudo aconteceu?
A banda nasceu com os irmãos David e Nuno Francisco, no baixo e na bateria, respectivamente. Mais tarde conheceram o Billy através de um anúncio colocado na internet. A relação foi, desde logo, muito positiva e o Billy tornou-se de imediato o vocalista e guitarrista. Após várias alterações estruturais no seio da banda, em 2011 também através de um anúncio colocado na internet, surgiu o Miguel como guitarrista/teclista.
Era um sonho de adolescente, serem membros de uma banda rock?
Todos nós começámos a tocar bastante cedo e enquanto adolescente pertencemos cada um a várias bandas de rock. Eram bandas de adolescentes e era apenas o início das nossas experiências enquanto músicos, mas podemos dizer que sempre tivemos o sonho de continuar a tocar, a fazer parte de bandas e, principalmente, quando pensávamos em longo prazo e nos imaginávamos com mais uns bons anos em cima, imaginávamos poder continuar a fazer parte de bandas de rock. É assim que ainda hoje nos vemos quando nos imaginamos daqui a 30 anos!
Têm outras profissões para além da música, certo? Gostavam de poder viver em exclusivo dela?
Sim, todos nós temos as nossas profissões e neste momento seria impossível viver exclusivamente da música. Gostávamos muito que isso acontecesse, principalmente para termos o tempo e as condições para nos dedicarmos ainda mais, para termos mais tempo para compor, para gravar, para promover o nosso trabalho e para passar mais tempo na estrada.
Em 2010 lançaram Mirrors, o vosso primeiro registo de originais. Se vos pedisse para caracterizar esse trabalho identificando eventuais diferenças entre ele e o EP Roll, de 2008, o que diriam?
O EP Roll é o primeiro registo gravado de Uni_Form. Achamos que talvez seja um pouco menos maduro e com um registo mais “escuro”. O álbum Mirrors, apesar de continuar um pouco no espírito do “do it yourselve”, isto porque não recorremos a estúdios para a gravação e captações, achamos que acaba por de certa forma ter um pouco mais de maturidade e talvez um rumo mais definido.
Olhando em redor como observam o momento atual da música que se faz por cá?
Existem muitas bandas portuguesas a surgir neste momento. Achamos que este acontecimento é importante e positivo. A nosso ver existem várias bandas com bastante qualidade que acabam por ser muito menos promovidas que outras que, em nossa opinião, não têm a mesma qualidade ou interesse musical. Achamos que há lugar para todos, mas lamentamos o desequilíbrio que se verifica neste sentido.
Dos nomes atuais, nacionais e estrangeiros, quem vos inspira e porquê?
Há nomes como os The Cure, que continuam a tocar e a produzir álbuns e que nos continuam a inspirar, mas há também outras bandas que gostamos muito de ouvir, muitas talvez até nem sejam influências ou inspirações directas para o trabalho que desenvolvemos, mas gostamos do seu trabalho. São os casos de Radiohead, Sigur Rós, Toy, 2:54, Tamaryn, The Horrors, S.C.U.M., O’ Children, Nick Cave, Papercutz, A Jigsaw, Dead Combo, Sétima Legião…
Se tivessem essa possibilidade, gostariam de convidar essa pessoa para uma participação num futuro trabalho?
No nosso novo álbum, o “1984”, contámos com a participação do João Rui dos A Jigsaw para a música “We are the dead” e com os Papercutz que produziram um remix do “Still Alive”. Nós gostamos de trabalhar pontualmente com outros músicos. Por vezes surgem inputs muito positivos para as músicas em concreto, mas por outro lado também se criam certos laços e sinergias.
Lançaram recentemente o álbum 1984. De onde surgiu o nome?
O nome surgiu da obra literária de George Orwell.
…”falta de liberdade de expressão, sistemas políticos que controlem as massas”…quase vemos uma certa atualidade na obra de George Orwell, concordam?
Concordamos. Foi exactamente esse o motivo que nos levou a adoptar o nome e o conceito da obra de George Orwell e a adaptá-lo às nossas composições e disco. Este disco é, para nós, um grito, uma manifestação de descontentamento com a falta de liberdade de expressão, com os mecanismos de controlo de massas, com uma certa repressão e perda de poder do indivíduo e do povo.
Escolheram como música de apresentação “Still Alive”, porquê?
É um grito de libertação de dogmas e obrigações e de celebração à vida. Uma forma de nós nos voltarmos a apresentar com garra para lutar contra o que for e que também aparece espelhado no coração das pessoas que vivem esta altura tão complicada em Portugal, e no resto do mundo. O momento foi o ideal para lançar como single algo que diz “Ainda estamos vivos, embora eles digam que estamos errados, não, nós ainda estamos vivos e vamos continuar a lutar pelo que acreditamos, pela nossa felicidade”.
A edição física do single contém um remix de :papercutz e uma colaboração com João Rui, dos A Jigsaw. Como surgiram estas colaborações?
Estas colaborações aconteceram de uma forma muito espontânea. Apesar de não termos uma afinidade directa a nível de sonoridade no trabalho que desenvolvemos, nós gostamos muito do trabalho que cada um deles produz e pareceu-nos interessante podermos trabalhar algo em conjunto.
Deram a conhecer recentemente o vídeo para a música que dá nome ao álbum, 1984. O que pretendem transmitir através dele?
Este vídeo espelha a temática do álbum e dos conceitos referidos anteriormente. A nossa ideia era traduzir de forma gráfica para o vídeo a repressão, o controlo das massas, a falta de liberdade de expressão. A Moopie vídeos, equipa que realizou o vídeo trouxe-nos óptimos inputs visuais quer pelas imagens que ilustram este conceitos, quer pelos efeitos usados que de certa forma representam um ofuscamento das pessoas que estão sob o efeito “Big Brother”.
Como foi fazer a primeira parte do concerto dos She Wants Revenge?
Foi muito bom fazer a primeira parte dos She Wants Revenge, partilhar o palco com esta banda e poder trocar algumas ideias. Foram dois dias intensos mas muito positivos, com o Hardclub e a Sala Tmn ao Vivo cheias.
O que podemos esperar do concerto de dia 08 no Centro Cultural de Belém?
Antes de mais uma celebração muito merecida aos Joy Division, com muita garra e envolvimento.
Nervosos ou calmos e expectantes relativamente a essa noite?
Calmos, mas com uma grande responsabilidade em cima! Estamos muito expectantes relativamente a esta noite.
Texto: Sandra Pinto
Fotos: Luís Pissarro